quinta-feira, 30 de abril de 2009
'o amor nos tempos do cólera', de gabriel garcía márquez
"florentino ariza, por outro lado, não deixara de pensar nela um único instante desde que fermina daza o rechaçou sem apelação depois de uns amores longos e contrariados, e haviam transcorrido a partir de então cinquenta e um anos, nove meses e quatro dias. não tivera que manter a conta do esquecimento fazendo uma risca diária nas paredes de um calabouço, porque não se havia passado um dia sem que acontecesse alguma coisa que o fizesse lembrar-se dela." trecho de 'o amor nos tempos do cólera'.
três semanas atrás terminei a leitura de 'o amor nos tempos do cólera' (1985), do escritor colombiano gabriel garcía márquez. antes mesmo de ler o livro já estava disposto a escrever alguma coisa sobre o assunto, especialmente por se tratar de um escritor fora de série.
num texto de cronologia não muito linear, encontramos a história de um triângulo amoroso: florentino ariza, fermina daza e juvenal urbino. florentino é, na verdade, apaixonado por fermina que o pretere para, logo em seguida, se casar com juvenal. o livro, em grande parte, acompanha os mais de 50 anos de paixão e espera de florentino por fermina. basicamente, é isso, mas o livro não se restringe ao "basicamente"...
são páginas e mais páginas de elegância e de estilo em discussões profundas sobre a velhice (tema, aliás, recorrente em sua obra), sobre autonomia e convenções sociais, sobre o amor no que ele possui de fantasioso e ao mesmo tempo rotineiro e desgastante, sobre as renúncias que a vida a dois e a solidão proporcionam às pessoas, sobre a formação da américa latina moderna.
antes do livro, li alguns comentários na internet de outros leitores sobre o livro. nada muito especializado. ainda assim, fiquei meio decepcionado com algumas interpretações dadas. não me considero nenhum crítico literário, mas percebi que as pessoas se apegaram muito à palavra "amor" do título e encararam o livro sob uma ótica muito romântica.
desconfio que o amor não é necessariamente o tema central do livro, pois, em vários momentos, ele funciona muito mais como um pretexto para o autor falar de outros assuntos. o tempo, por exemplo, me pareceu muito mais determinante para a compreensão da história do que propriamente o amor. aliás, o acento que o autor dá ao tempo de espera de fermino ariza me faz desconfiar da importância que ele tem para a trama.
a meu ver, é o tempo, e não o amor, o quarto personagem no núcleo da história, pois ele vai passando de formas bem específicas para cada um dos personagens, inclusive os secundários. ao longo da vida, todos eles vivem alegrias, tristezas e esperas, que de tão marcantes, vão evidenciando o início e o fim de ciclos em suas vidas.
a passagem lenta do tempo é essencial para termos uma perspectiva mais completa do triângulo amoroso e o ambiente no qual estão inseridos. é fundamental que entendamos como cada um dos três protagonistas viveu aqueles cinquenta anos para entendermos suas motivações, suas decisões e escolhas.
no final, minha sensação foi de que a velhice traz o esclarecimento necessário às escolhas feitas na juventude; por outro lado, as experiências não vividas na juventude são resgatas e vividas no fim da vida, criando uma certa circularidade onde o início e o fim da vida se reencontram.
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Um comentário:
Parabéns pela narrativa do seu ponto de vista do livro. Também penso que é o tempo e a espera que dão vivacidade à belíssima história. Gabriel García Márquez é um belo capítulo da literatura mundial. Sou fã do escritor e suas obras.
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